segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

MEMÓRIA DE MINHAS PUTAS TRISTES

Nessa madrugada, com insônia, devorei "Memória de minhas putas tristes", do Prêmio Nobel de Literatura de 1982 Gabriel García Márquez, o qual havia comprado há mais de ano e continuava lacrado (é tanta coisa pra ler que acabo sem saber o que fazer). Uma obra-prima, sem dúvida alguma. Trata de um dos assuntos sobre o qual mais me debruço em meus textos: o amor. Uma história de amor entre um ancião que passou a vida inteira fugindo (do amor), andando de bordel em bordel, e uma ninfeta. O romance é tão eletrizante que não há nenhum motivo que o faça parar a leitura. O leitor quer chegar logo ao fim, para saber o desfecho. Vale mesmo a pena comprar e ler o romance.
Leiam uns trechos que transcrevo abaixo:

1. Os adolescentes de minha geração, ávidos pela vida, esqueceram de corpo e alma as ilusões do porvir, até que a realidade ensinou a eles que o futuro não era do jeito que sonhavam e descobriram a nostalgia.

2. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma e sim um signo do zodíaco.

3. Tomei consciência de que a força invencível que impulsionou o mundo não foram os amores felizes e sim os contrariados.

4. A fama é uma senhora muito gorda que não dorme com a gente, mas quando a gente desperta ela está sempre olhando para nós, aos pés da cama.

5. O sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança.

6. Porque o amor me mostrou tarde demais que a gente se arruma para alguém, se veste e se perfuma para alguém, e eu nunca tinha tido para quem.

7. Havia achado, sempre, que morrer de amor não era outra coisa além de uma licença poética. Naquela tarde, de regresso para casa outra vez, sem o gato e sem ela, comprovei que nao apenas era possível, mas que eu mesmo, velho e sem ninguém, estava morrendo de amor. E também percebi que era válida a verdade contrária: não trocaria por nada neste mundo as delícias do meu desassossego. Havia perdido mais de quinze anos tratando de traduzir os cantos de Leopardi, e só naquela tarde os senti a fundo: Ai de mim, se for amor, como atormenta.

8. Desde então comecei a medir a vida não pelos anos, mas pelas décadas. A dos cinquenta havia sido decisiva porque tomei consciência de que quase todo mundo era mais moço do que eu. A dos sessenta foi a mais intensa pela suspeita de que já não me sobrava tempo para me enganar. A dos setenta foi temível por uma certa possibilidade de que fosse a última. Ainda assim, quando despertei vivo na primeira manhã de meus noventa anos na cama feliz de Delgadina, me atravessou a ideia complacente de que a vida não fosse algo que transcorre como o rio revolto de Heráclito, mas uma ocasião única de dar a volta na grelha e continuar assando-se do outro lado por noventa anos a mais.

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