(RÔ Campos)
Um grão de areia
Um pingo d'água
Um deserto
Um oceano.
Um grão de areia pode cegar
Um pingo d'água pode afogar
Todo deserto tem um oásis
Todo oceano separa.
De grão em grão fez -se o deserto
De pingo em pingo se enche um cântaro
Todo deserto é solidão
Todo oceano é mistério
Decerto que o vento que sopra lá
Não é o mesmo vento que sopra aqui
Decerto que a solidão é um deserto
E todo deserto é uma prisão a céu aberto.
Decerto que um pingo d'água pode matar a sede
Decerto que num oceano inteiro não se tem água pra beber
Cada qual é o que se é
Tudo a seu tempo e hora.
segunda-feira, 15 de junho de 2020
quarta-feira, 3 de junho de 2020
A DOR DA DOR QUE SENTE
(RÔ Campos)
Por que tem que ser assim tão longe
O que vive dentro da gente?
E as nuvens leves pesarem com o tempo, num acúmulo de forças
A desabar como forte chuva sobre as nossas cabeças?
O que foi feito do sol que até ontem à noite ainda dormia plácido
E havia sol, lua e estrelas no céu que nos cobria?
Aonde foi parar a fé que, depois de longa agonia,
Foi morar em cada flor que se abria
E não havia nem escuridão nem medo?
E vieram tantos que se diziam pequeninos e se queriam profetas·
E bradavam que a esperança ,com sua espada,
Venceria o algoz de todos nós - Golias,
Golpeando a face obscura das gentes que se diziam
Um despertar de um novo tempo, um voo alto, um canto cálido·
Mas o que se vê, agora, o que se ouve, o que se sente:
Os olhos eram cegos e não viam
E os ouvidos se perderam entre as bigornas, os estribos e os martelos·
A carne apodrecendo nos becos do esquecimento
Ou nos corredores de paredes brancas sob os olhares dos aflitos,
Nada mais sente a não ser a dor da dor que sente,
E os gritos que saem da boca dos homens de amores famintos
Que agonizam ali nos corredores da morte
Enquanto demora a morte total e morrem aos poucos os sonhos que não mais voam:
Asas partidas, céu sem vento, esperanças perdidas·
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