sábado, 26 de julho de 2014

SENTIMENTOS


(RÔ Campos)

De costas pras montanhas,
De frente pro sol.
Não procuro altitudes.
Almejo sempre a luz
Que dissipe a escuridão.

À direita, uma mesa surrada,
Um coco usado, vazio;
À esquerda, o mar sereno;
Acima, o céu azul piscina.
Em mim, as lembranças:

Os quadros, os retratos, os discos,
Os cheiros na cozinha, no quarto, no jardim,
Os vinhos, o churrasco, as doces tardes de domingo,
Os parentes, os amigos, a viola,
As crianças correndo, a bagunça na casa,
O cachorro latindo, a noite chegando,
O amor partindo...

LÁ VOU EU, DE NOVO


(RÔ Campos)

Lá vou eu, de novo,
Mão na massa,
Mão nos sonhos.
Cada vez que uma flor se abre,
Corro pra sentir o seu perfume.
Cada vez que nasce o dia,
Corro pra abrir as janelas,
Pra que entre a Luz
E inunda minha casa de energia.
Lá vou eu, de novo,
De volta ao passado,
Correndo pro futuro.
Lá vou eu, de novo,
Descobrir outros mundos,
Derrubar muros.

domingo, 20 de julho de 2014

SE EU SOUBESSE


(RÔ Campos)

Saudade é como traça: aos poucos vai nos transformando em pó·
Saudade é que nem fogo, que nos faz arder e a gente pensa que é só calor· Quando nos damos conta, já nos consumiu por inteiro·
Saudade é um troço danado·
Pra onde a gente se vira, vê a face do amado, ouve a voz de quem calou, e sente o fogo da fogueira que o destino apagou·
Mas não há pior saudade do que aquela que um dia nunca se pensou·
Se eu soubesse, naquele dia, não teria sido Madre Tereza de Calcutá·
Se eu soubesse···não estaria aqui hoje a chorar,
Com essa saudade morando no peito,
Como se fosse cupim a me devorar·

quinta-feira, 17 de julho de 2014

LUA DE SEGUNDA



(RÔ Campos)

Lua linda no céu de segunda·
Deusa vestida de branco,
Deitada em lençol de cetim crivado de brilhante:
Todo mundo queria vê-la, ali, estonteante,
No céu de julho, lua linda,
Lua cheia de luz.

Lua que me fez querer saber
Por que o amor é assim,
Às vezes dormente,
Outras vezes, de repente·

Lua linda no céu de segunda,
Crivado de brilhante·
E eu a me lembrar de quando o amor adormeceu
Um sono que ainda me parece eterno,
Ou quiçá desperte numa outra estação.

Lua linda, de uma noite de segunda,
Num dia qualquer de verão·
Que vem e me diz que o amor não tem tempo nem pátria,
Como a lua linda de segunda
No céu crivado de brilhante:
Lua linda, lua cheia de luz,
Que é de todos e não é de ninguém·

COLAPSO

(RÔ Campos)

Um coração cheio de vielas, artérias, veias, feito teias,
Pulsa e pulsa lentamente,
E hora outra acelera de repente·

Quer sair, fugir, sem saber pra onde,
Dessa prisão em que às vezes se esconde,
Sob pressão que sobe e cai e volta e vai:

Colapso mitral!

O sangue veloz, louco feroz,
Estrangulando a minha veia volta e meia·
Eis-me aqui, agora, coração,
Cansado, pálido,
Partido, necrosado,
Latifúndio improdutivo,
Terra de ninguém,
Loteado ao léu
Sob o imenso céu que nos cobre,
Prometido aos incautos,
Crentes, inocentes úteis·
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VIRANDO DO AVESSO

RÔ Campos)

Você me fez um convite·
Estava, assim, tão decidido,
Como se a minha vida fosse triste,
Alguém à procura de um Cristo,
Em busca do paraíso perdido·

Você me chamou e me disse
Como seria bom se eu me convertesse;
Eu, então, lhe respondi:
Eis uma grande ideia,
Eu me converto·
Vou me deixar,
Vou me esquecer,
Vou me entregar,
Vou me virar do avesso·

ABSTRAÇÕES


(RÔ Campos)

Era noite;
Fui ao quintal;
Estava claro.
Olhei para o céu;
Vi a grande lua no alto,
Que também riscava o chão.

Me perguntei sobre tanta beleza.
E essa feiura que teima, obstinada,
Em muitos corações que queimam
Nas fogueiras da vaidade.

E também sobre o amor
E a dor...
Os sonhos e a realidade.
A razão e o coração.
E a intrusa saudade
Que, às vezes, sem querer,
É como o sal que dá sabor.
E outras tantas vezes abusa,
De um quase direito de nos fazer sofrer.

Ainda contida em minhas abstrações,
Com os olhos voltados para o céu,
Me pus a perguntar à Gaia e Urano
(Não sem lembrar de Palas Atena e Ares)
Sobre este imenso mundo de deuses inventados,
E de homens perdidos nos labirintos traçados
Entre a guerra e a paz
Que Tolstói muito já nos disse...

E perguntei também a Urano:
- Onde é que a lua se esconde
Quando paira a escuridão?

E perguntei também a Gaia:
- O que seria de nós se não fosse a luz?

quinta-feira, 10 de julho de 2014

DE QUE É FEITA A VIDA


(RÔ Campos)

Depois que a cheia vazar
A poeira sentar
A dor diminuir
A tristeza passar
Eu volto pra vida
E deixo a vida me levar
(Pela porta que nunca fecho)
Até chegar a próxima agonia.

É nessa onda perigosa que eu surfo
E nesse rio turbulento que navego
E assim eu vou...vivendo
Como o samba, que ri e que chora
E a noite que derrama em silêncio
No orvalho da madrugada
As lágrimas das almas aflitas
Que queimam nas fagulhas dos incêndios.

Porque a vida é feita disso:
De alegrias e tristezas
Cair e levantar
Sonhos e incertezas
Calmarias e vertigens.
De "quem sabe ?"
Ou talvez.
E da solidão de quem se vê sozinho

segunda-feira, 7 de julho de 2014

DEPOIS QUE O TEMPO PASSOU


(RÔ Campos)
Já faz muito tempo, houve um tempo em que a gente achava que o tempo nunca passaria. E pedíamos a ele que corresse. Queríamos crescer, virar gente grande, fumar um cigarro, tomar um drinque.
Aí, então, o tempo foi passando. E, como tínhamos pressa, não percebíamos que o tempo se ia, levando com ele, a cada por-do-sol, a cada lua que dormia, um pedacinho de nós.
E, agora, depois que o tempo passou, eu vivo a pensar no sol e na lua, que muitas vezes deixei de olhar, com tanta pressa que eu tinha, de ver o tempo passar...
Bate um desejo de botar as mochilas nas costas, seguir por aí, sem qualquer direção, ganhar o mundo. Mas, de repente, eu me lembro que os sonhos também batem as pernas. E que os sonhos de menina são como fios de cabelo, agora brancos, que, com o tempo, caem e perdem a cor...