domingo, 29 de setembro de 2013

DURA PENA


(RÔ Campos)

Minha alma vive livre sem amar
Num mar tão calmo e céu azul.

Minha alma já não crê no que virá
Porque meu coração não mais espera.

Por isso eu pergunto aos juízes:
O que é viver num mundo sem amar
Cumprindo dura pena em liberdade?

Então eu imploro a Deus que me condene
A crer de novo que amores são possíveis.

TUDO POR NADA

(RÔ Campos)

(Uma singela homenagem à querida Michelle Freire, que amava a vida, funcionária desde sempre do Porão do Alemão, muito querida por todos, e que foi brutalmente assassinada ontem, nas ruas violentas desta Manaus também violentada).

Um cão nojento abreviou
A vida que tanto amavas.
Tudo por nada.
Tudo por nada.

Oh, Michelle!!!
Oh, Michelle!!!
Hoje o rock vai ser no céu!!!
O rock aqui na terra emudeceu!!!

AONDE O VENTO ME LEVAR (Sobre aforismo de Nietzsche)


(RÔ Campos)

"Desde que me cansei de procurar,
aprendi a encontrar;
Desde que o vento me fez frente
velejo com todos os ventos."

Assim, vou vivendo cada momento,
Seguindo o mar do meu destino,
Sem os reveses da força do vento:
Vou aonde o vento me levar.

domingo, 22 de setembro de 2013

IMANÊNCIA


(RÔ Campos)

Que a essência da terra me inunde a alma.
E que eu nunca esqueça do sabor da água,
Do cheiro da terra molhada,
Nem do céu azul sobre minha cabeça.

Que a essência da terra seja em mim constante.
E que eu nunca esqueça do cheiro da mata,
Do cantar do galo abrindo a porta da alvorada,
E da luz do sol invadindo a minha casa.

Que a essência da terra seja em mim constante.
E que eu me lembre sempre da beleza da flor se abrindo,
Dos passarinhos vigiando seus bebês em seus ninhos,
No cajueiro velho do quintal de minha casa.

Que a essência da terra seja em mim constante.
E que eu nunca me cegue ao espetáculo da lua,
Nem ao brilho das estrelas nas noites escuras,
Nem à beleza do arco-íris riscando o firmamento.

Que a essência da terra me inunde a alma.
E que meu coração nunca endureça diante da vida.
Que eu plante, quando a época for de semeadura,
Para que possa tudo colher quando chegar o dia.

Que a essência da terra seja em mim constante.
E que dela nunca faça tábula rasa.
Porque a natureza não é uma folha em branco,
Porém, um código imutável, infalível.

DO QUE É FEITA A VIDA


(RÔ Campos)

Não se vive sem os sonhos
Da doce ilusão que é a vida.
Real mesmo é a morte
Dos sonhos de quem já morreu
Porque esqueceu que viver é sonhar.

Aquele que diz viver
Sem a doce ilusão dos sonhos,
Queda a cada dia em penumbra cinzenta,
Onde não existe lua, nem estrelas,
Nem sonhos, nem mãos benfazejas.

Quero poder sonhar meus sonhos
A cada noite crua, sem lua
A cada manhã com negras nuvens.
Quero, assim, sonhar que colho flores
Sem me importar com seus espinhos.

Porque as feridas dos espinhos de hoje
São as cicatrizes de amanhã.
E as cicatrizes de amanhã
São a prova cabal de que vivi.
Tanto que, hoje, eu ainda estou aqui.

Sonhando os meus sonhos doces.
Sentindo saudades de quem tanto amei.
Uma saudade amiga, que me conforta
Que vem silenciosamente e me diz:
A vida é feita de sonhos...e saudade.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

CASTELOS DE AREIA


(RÔ Campos)

Era uma quente tarde de verão, num setembro não distante. Nessa época, o vento sopra muito forte em São Luís do Maranhão. Tão forte que voam mesas, cadeiras e até pessoas - dizem os repentistas -, na orla de toda a ilha bela de Gonçalves Dias, Josué Montello e Ferreira Gullar, e também de Carlinhos Veloz. Saí do hotel e me pus a passear pelas calçadas da avenida Litorânea, passos curtos, enquanto o sol e o vento disputavam um pedaço de meu rosto. Vez ou outra, envolta em meus pensamentos, eu voltava os olhos para o mar e avistava os surfistas bem próximos à praia, fazendo verdadeiros e perigosos malabarismos, e, ao longe, muitos navios parados, aguardando o momento para a descarga das mercadorias, no porto de Itaqui, na Baía de São Marcos. De repente, senti que a fome começava a gritar, e resolvi parar num dos inúmeros quiosques padronizados instalados na orla da praia do Caolho. Escolhi uma mesa plástica dentre as muitas postas na areia da praia, entre o quiosque e o mar, que me dava uma visão maravilhosa, tanto do mar quanto dos dois lados da praia. E ali fiquei novamente a olhar os navios. Meus pensamentos iam e vinham, no mesmo movimento das ondas que batiam nas areias da praia e voltavam para o mar.
Quantas situações interessantes se passaram diante dos meus olhos, durante aquelas horinhas mágicas ali na praia do Caolho, cujo nome nada interessante não consegui descobrir a que se deve, o qual também não faz jus à beleza natural do lugar, repleto de palmeiras que pareciam brigar com a força indomável do vento, e, a muito custo, mantêm-se imponentes, no entanto, sem a soberba dos que se julgam os donos do mundo, embora cônscias de sua magnitude.
Vi um casal que chegou, trazendo uma criança do sexo masculino, por volta, talvez, dos 12 anos. A mulher, uma balzaquiana, com o tamanho do quadril muito acima do normal e ancas imensas, cheias de grandes bolhas provocadas por celulites gigantes, coxas três vezes maiores que as minhas, alta, pesando, possivelmente, uns 130 quilos. Ela chamava a atenção de todos pela, digamos, anormalidade estética; o tamanho dos seios era diminuto, e do abdômen para cima a largura era totalmente desproporcional à parte inferior do corpo. O marido, um quarentão, moreno e bonito. Pois ela não se fez de rogada em nenhum momento: na praia, retirou a canga e foi, mostrando seu diminuto biquíni azul, até o banheiro do quiosque, enquanto a plateia inteirinha, boquiaberta, a olhava. Depois, seu companheiro a ajudou a fincar a canga na areia da praia, para ela deitar-se e se bronzear, indo, após, com o garoto, para mais perto do mar, onde ficaram a construir seus castelos de areia. Essa situação me fez lembrar de O Patinho Feio, do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen, e de quantas vezes senti vergonha do que não deveria, porque devemos aceitar as situações que não podemos mudar, e procurar mudar aquelas que podemos. E que, seja lá o que for, o importante mesmo é viver, sem se preocupar com os aplausos ou vaias da plateia, pois ela está ali para uma coisa ou outra, e nós, para fazermos o nosso papel no teatro da vida.
Depois, um casal com duas crianças do sexo feminino e mais o avô, puseram-se à mesa ao lado da minha. O pai, franzino, tinha uns grandes dentes, bem afastados um do outro. A mãe, um quadril pequeno e o abdômen protuberante, lábios inferiores enormes e desproporcionais aos lábios superiores. Esteticamente falando, eram feios. A criança menor tinha imensas orelhas. A maior, bem, a natureza resolveu premia-la. O casal parecia feliz, acariciava-se, o homem afagava os cabelos da mulher, beijava-a na boca e no rosto, e vez em quando levava as crianças para banhar-se no mar.
Depois, vi a poeta, sentada, escrevendo em seu laptop, olhos ao mar, enquanto o filho e o neto saíam a passear pela praia, juntando conchinhas, que encheram um saquinho plástico; queriam levar de recordação para a terra natal, onde não há mar, mas o rio que corta o Estado é um verdadeiro mar de água doce, tanto que Vicente Yáñes Pinzón o chamou de Santa María del Mar Dulce. Depois, o filho atirou-se ao mar, enquanto o neto, sob os olhares diligentes da vó, que parou de escrever para observá-lo, começou a cavar a areia da praia, dando a nítida impressão, pelas atitudes com as mãozinhas a apalpar a areia, que também começava a construir os seus castelos.
A vó, pensativa, voltou os olhos para os navios ao longe, encobertos pela névoa do final da tarde, e refletiu: seja nas areias da praia ou nas arenas da vida, em algum momento, ou em vários, nós sempre construiremos os nossos castelos de areia, até que o vento sopre forte e os desmanche.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

SABEDORIA



(RÔ Campos)

Envelhecemos antes; a sabedoria vem depois.
Às vezes é tarde: a casa cai, ou o amor se vai.
Oxalá nunca seja tarde demais!

Envelhecemos cedo; a sabedoria tarda.
O mundo gira feito uma roda gigante.
Giramos, giramos...e voltamos ao começo.

Envelhecemos jovens; a sabedoria é anciã.
Os anos se vão como as chuvas de verão.
Tornamo-nos sábios...

Mas o tempo, esse outrora aliado,
Ele dobrou a esquina do passado,
E tomou a estrada do futuro do pretérito.

Eu estaria lá. Quem sabe, eu estaria lá,
Se o tempo não me tivesse consumido,
Se ainda fosse cedo para a sabedoria.














AS BÊNÇÃOS DE OYÁ


(RÔ Campos)

Oyá, Oyá!
O vento bateu forte
Era rio, e era mar.

Oyá, Oyá!
Hoje clamei por ti
E recebi tua proteção.

Oyá, Oyá!
Outra filha também te chamou
Pra apaziguar a fúria de Xangô.

Oyá, Oyá!
Arremeteste o grande pássaro
Que voltou a riscar o céu.

Oyá, Oyá!
O dia ficou mais lindo
Quando o pássaro pousou.



sábado, 7 de setembro de 2013

ROSA


(RÔ Campos)

Por onde andas, não sei
Eu vou ficando por aqui
Fingindo que já te esqueci
Enquanto lembras de me esquecer.

Seja lá o que Deus quiser!

Todos dizem quem ama perdoa
E eu vou ficando por aqui
Fingindo a minha dor
Sem nem mais saber quem sou.

Seja lá o que Deus quiser!

Amanhã, eu posso até morrer
Mas o mundo não irá testemunhar
Que Rosa chorou, mas não sorriu
Que Rosa viveu, e não amou.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

DAS COISAS QUE EU NÃO ENTENDO


(RÔ Campos)

Das coisas que eu não entendo
Às vezes vêm as respostas
A perguntas que nunca fiz.

Das coisas que eu não entendo
Às vezes faço perguntas
E as respostas nunca vêm.

Das coisas que eu não entendo
Até hoje não sei quem sou
De onde vim, pra onde vou.

Das coisas que eu não entendo
O amor perdeu as pernas
A prepotência fez a guerra.

Das coisas que eu não entendo
A riqueza e o seu diapasão
A morte a todos iguala.