terça-feira, 21 de setembro de 2010

DE RIO-MAR A SERTÃO

Rachou meu chão, meu pai
Rachou meu chão, de novo
E tantas outras vezes, virão
De onde há de sair o pão, meu pai?
De onde há?

Foi assim, em outra ocasião
Não faz muito tempo, não
Precisei caminhar léguas em busca de água, do pão
Os pés ardiam, pareciam descalços
Sob o mesmo sol que nos dá vida, e agora nos castiga
Onde outrora era um rio, quase um mar, meu pai
Hoje, é sertão.

Minha canoa ressecou, encalhou frente à choça que nos abriga
Meu curumim chora, chora
Foi-se nossa única vaquinha
Sede, a causa da morte
Tendo a fome como agravante
Não há mais tetas, nem leite pra tomar
Nem a vaquinha pra correr, brincar
E nós, aqui, meu Pai, no meio do fim do mundo
(Onde tantos forasteiros acorreram, em busca do Eldorado)
Entregues à nossa própria sorte, sem um norte.

Rachou meu chão, meu pai
Rachou meu chão, de novo
Meu coração agora chora e sangra
Onde antes era abundância
Hoje, é só desolação
Sede, fome, solidão...
A luz, que era pra todos, aqui, não chegou, não
Só as estrelas e a lua, pra retirar o véu da escuridão.

Chora a floresta, que o sol, inclemente, queima
Chora o caboclo, sem água, sem peixe
Chora minha cunhantã, de olhos tristes
Chora meu curumim, que nada entende
Choro eu e também minha mulher, descrente
Não sei se vamos, ou se ficamos
Se sair daqui, não serei vivo
Se aqui ficar, estarei morto.


RÔ Campos, 21 de setembro de 2010

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