domingo, 15 de julho de 2012

QUANTO TEMPO! (RÔ Campos)

Cadê você? Eu nunca mais o vi. Temos corrido demais, e não há mais tempo para as coisas do coração. Andamos de mãos dadas com a velocidade. Corremos em busca de tudo, e nos deparamos sempre com o vazio, com o nada. Deixamos tudo para trás. Já nem sabemos fazer um afago. Ah, quanto tempo, quanto tempo! O cheiro da omelete. O café quentinho depois do almoço. As cadeiras na calçada. Os risos, as piadas. Os inesquecíveis brigadeiros. O churrasco, o papo com os amigos, uma loira gelada. Os passeios pela estrada. As sessões de Cinema em Casa. Quanto tempo! Quanto tempo! Cerro os olhos ... e já é dia. Toco as cortinas ... e já é hoje. Mas já passou. Amanhã ... o amanhã chegou. Ainda não li aquele romance de Guimarães Rosa, que ganhei de presente no último verão e esqueci no criado-mudo. Já saiu de cartaz o filme que estourou bilheterias : “O Último Romântico”. O Teatro Casa das Artes ruiu. Minha banda preferida veio ao Brasil. Não soube, não vi. Ainda não conheci minha sobrinha-neta. Tantas pessoas lindas encantaram-se. (Guimarães Rosa disse que as pessoas não morrem; elas se encantam). Fernando Pessoa? “Morrer é não ser mais visto”. Quanta coisa vivi. E quanta coisa deixei passar. Conheci Don Juans, homens bem intencionados e mandriões. Mentirosos, cafajestes, finórios, ingênuos. Soube de padres, bispos, políticos e outras espécies tais. Colei grau e me pós-graduei em zoologia. Aprendi um pouco sobre e com os animais. Quando criança, cri. Cresci crendo, Descri. Hoje creio muito mais. (Deus está além dessa divindade perversa, diabólica, punidora, arquitetada pelo homem). Minha crença em Deus caminha com o Darwinismo. Acredito que a natureza é uma Deusa. Grandes são os seus segredos. Profundos os seus mistérios. Nunca mais abracei meus filhos, beijei seus rostos. Nunca mais eles me elogiaram. As portas trancadas nos separam. Receio o futuro.. Tenho medo da frieza , do desprezo, do deboche. Ontem fui tudo, e hoje não sou mais nada. A velhice é inevitável para quem não morreu . E, então, perdemos a força. O olhar é cansado. As tempestades pesam como chumbo. Ventania! Quanto tempo! Quanto tempo! Minha mãe cosendo nossos vestidos pro Natal. As deliciosas rabanadas. O bolo simples. O brinquedo escondido debaixo da cama. A bênção na hora de deitar. Mama me desejando “boa sorte”. Saudades! Saudades! De correr no imenso quintal. De jogar bola de gude. E de tantas outras brincadeiras de criança... De pisar a terra. Dançar no bumbá Luz de Guerra. Quanto tempo! Quanto tempo! Nunca mais sentei num banco de praça. Nem levei as crianças ao Circo. Não sei quem é meu vizinho. Onde inauguraram o novo parque. Se é que há um novo parque. Quanto tempo! Quanto tempo! O ontem está tão perto e tão longe. Ando aceleradamente em busca do amanhã. Não existe mais tempo pra vida. Curtir · · há 3 minutos ·

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